sábado, janeiro 28, 2006

palavras odiadas [2]

" criado. precisa-se, com 25 anos, muito humilde...

(...) agora, aqui estou na cama, deitado ao comprido, a odiar à minha vontade essa palavra vil... sim, essa palavra vil que - mascarem-na como quiserem, com infinito, com anjos, com 'pequenez do homem diante das estrelas', com rojos de santos orgulhosos - no fundo significa, apenas e sempre, falta de carácter, moleza de ânimo, capacho, erva submissa, áulico curvado...

criado humilde, precisa-se?!...

por mais que me esforce não consigo compreender como há bichos humanos que só se comprazem em lidar com animais de músculos de cera e colunas vertebrais de arame, sem personalidade, sem cor, sem reacções, - apenas lambe-botas com a alma cheia de ecos dos nossos sins. qualquer coisa de semelhante à água que se adapta molemente a todos os feitios e mesmo quando endurece, quando gela, ainda conserva a forma da última vasilha.

humilde?... criado humilde, precisa-se?!...

ah! se dispusesse de dinheiro e de coragem para ter criado, com que prazer publicaria amanhã, na primeira página do diário de notícias, este anúncio enorme como um berro:

criado. orgulhoso como um lorde, de coluna vertebral de aço, que não consinta que o tratem por tu, nem pertença aos 'josés'. precisa-se.

humilde?!...
que vontade de partir caras!"

(fragmento do conto insónia, josé gomes ferreira, in o mundo dos outros: histórias e vagabundagens, 1950)

ecos da blogosfera (com o posto de escuta em modo pausa)

posts enjoados sobre a fita match point, de woody allen e posts virulentos sobre a fita das presidenciais marcam os últimos dias na blogosfera nacional.
quanto à 1ª obra de ficção, não me posso pronunciar: não vi ainda.
a 2ª vi. mas preferia não ter comprado o bilhete.
péssima direcção de actores.
enredo demasiado previsível.

palavras odiadas

"fulano é tão educado"
parece-me sempre que estão a falar de cães.

o antagonista

sem salieiri, mozart não teria metade da piada.

segunda-feira, janeiro 16, 2006

bandas sonoras da vida

quando amadou e mariam disseram aos pais que se queriam casar, eles não queriam aceitar porque não viam futuro para uma família de cegos num país pobre como o mali.
só que além do amor, eles tinham outro aliado poderoso: a música.

no momento em que se conhecem num instituto para jovens invisuais em bamako, em meados dos anos 70, amadou vivia já uma experiência interessante como guitarrista em orquestras de hóteis. mariam expandia o seu talento como cantora, no instituto.

em 1980, o amor culmina em casamento e o talento musical numa carreira em dueto. não é fácil, mas a sua música começa a ser conecida: primeiro na região e depois na europa. gravam 3 discos com edição internacional entre 1998 e 2002, mas é em 2004, com dimanche a bamako, produzido por manu chao, que explodem.

é um som fiel às raízes dos blues do mali, mas agitado por uma componente funk generosa, com elementos da salsa, do reggae, da pop, entre outros, numa fusão rítmica irrestível, imparável e incansável.

descobri-os na última edição do festival músicas do mundo (fmm), em sines, no verão do ano passado. o concerto deles é das melhores memórias que tenho desse festival. a alegria de viver que a música lhes dá emociona e contagia. foi um dos pontos altos, tão bem descrito no site do fmm:

"amparados um no outro, amadou & mariam não puderam ver o baile que estavam a montar no terreiro do castelo. mas puderam imaginar o prado de felicidade a desabrochar à sua frente. foi o concerto mais amado do dia."

nos últimos dias, dimanche a bamako tem-me acompanhado.
é uma música carregada de afectos, força, coragem e esperança.
carregada de tudo o que o ser humano tem de melhor.
sempre que os obstáculos parecem difíceis de ultrapassar, vale a pena pensar no exemplo deste casal.
e ouvir a sua música.
afinal, a vida também tem bandas sonoras.

quarta-feira, janeiro 11, 2006

o pensamento de daniel boorstin (condensado)

pseudo-acontecimentos há muitos, seus palermas

"então, e projectos para o futuro?"

esta irritante pergunta feita insistentemente por jornalistas ou por apresentadores de programas televisivos de "variedades" em que se entrevistam cantores (ou actores ou realizadores ou escritores) provoca-me sempre arrepios e suores frios.

apetece responder com o josé mário branco visceral do fmi dos anos 80, no volume máximo:

"sempre a merda do futuro, a merda do futuro ?!!!

quero ser feliz, porra !!!

quero ser feliz agora !!!

que se foda o futuro !!!"

segunda-feira, janeiro 09, 2006

o 'até (b)logo' no posto de escuta!

este blog foi citado 2 vezes no posto de escuta, no dia 7 de janeiro.
só o descobri agora!
pus o habermas de lado e bebo uma cerveja, para comemorar.
(o raposeira pareceu-me excessivo pois a noite promete ser longa.)

"para que serve uma tuna ?!!!"

segundo o site oficial da sua candidatura à presidência da república, cavaco silva foi hoje a leiria almoçar com "os jovens que têm 'colorido' a campanha com uma onda de entusiasmo".

a antena 1 esteve lá e nos habituais "diários de campanha" (orquestrados magistralmente por maria flor pedroso) relata que neste encontro actuou uma tuna e que cavaco silva posou sorridente para a foto.

a tuna foi paga pela campanha.

compare-se as palavras do candidado, reproduzidas na notícia em destaque no site e as palavras do magister da tuna, aos microfones da antena 1:

" 'são vocês que vão credibilizar a vida política. Acredito na vossa capacidade para dar mais prestígio à vida política portuguesa', disse [cavaco silva] agradecendo a animação, a energia e o entusiasmo que os jovens trouxeram para as suas iniciativas de campanha."

"não estamos aqui a apoiar politicamente ninguém. pagaram-nos para animar o encontro e é isso que estamos a fazer."

a propósito do "discurso filosófico da modernidade" de habermas (amanhã há frequência...)

se você tem uma idéia incrível

é melhor fazer uma canção.

está provado que só é possível

filosofar em alemão.


(fragmento de língua, 1984, caetano veloso)

quinta-feira, janeiro 05, 2006

avaliações de fim de semestre(s)

janeiro e junho são os meses mais cruéis

("roubado" a pedro mexia e adaptado às contingências)